Minha vida numa vitrola

Quando eu era “xóvem”, contando 20 primaveras, um dos meus passatempos prediletos era ser rata de sebo de vinil. O meu favorito era o Fígaro, Fígaro, Fíííííígaro, que (graças a Deus e aos donos) ainda funciona na Lamenha Lins, rodeado de prédios antigos lindíssimos.

Eu era apaixonada pelas bolachas, fossem elas da cor laranja, rosa, azul, amarela, ou, o clássico dos clássicos, o disquinho preto. Naquela época, corria os sebos atrás da minha obsessão por completar a coleção de álbuns do Caetano. Lembro da felicidade que senti quando encontrei o primeiro solo dele, que tem Alegria, Alegria, a preferida da minha mãe. Paguei o olho da cara de Tieta, eta, eta.

Assim como os livros que meus pais compravam, os LPs marcaram a minha infância e continuam ocupando um lugar especial na minha vida. 

Depois de 70 dias de quarentena, é realmente uma tarefa estafante encontrar opções pra entreter uma criança de 4 anos que salta do Netflix ao YouTube. Do celular à televisão. Da amoeba – que suja o teto, gruda na roupa, me deixa louca – ao jogo de tabuleiro do Toy Story. Do Talking Tom pro Just Dance.

Resolvi, então, fazer um experimento com Totônio e dar uma de mamãe DJ. O guri dispensou logo de cara meu Abbey Road, o último – e um dos melhores – discos gravados pelos Beatles (o último lançado foi Let it be), que virou um tiozinho de meia idade ano passado. Mas resolveu dar uma chance ao disquinho cor-de-rosa com historinhas do arco da velha, que o pai dele ouvia quando pequeno. Achei que Totônio ia torcer aquele narizinho fofinho pro ruído do vinil velho, girando, girando, girando no toca-discos que, diga-se de passagem, não é profissional, mas é bonitinho e cumpre o prometido em se tratando de custo-benefício. 

Pensei ainda que o guri meteria a mãozinha de dedinhos compridos na pequena agulha de safira que dura o suficiente para ouvir apenas uns 50 discos. Consegui impedir que ele destravasse a agulha com seu modo sutil e, voilà: surgiu aquela música estridente dando espaço para a voz da Janete Clair, a narradora e célebre autora de novelas.

Totônio estava entretido com um jogo de tabuleiro, mas conseguia prestar atenção às historinhas, bastante significativas, embora curtas. Tanto é que, no dia seguinte, pediu pra ouvir novamente a do Coelhinho e da Raposa.

A raposa tenta comer o coelho de tudo quanto é jeito. O bichinho, de voz irritante, chega até a ficar preso num espantalho, mas consegue escapar do predador. É claro que o verdadeiro sentido da história – que a raposa corre pela refeição e o coelho, pela vida – Totônio vai aprender no decorrer da sua jornada, que já começou um tanto diferente se compararmos a outras gerações. 

O que importava messsssmo pra ele, naquele momento, não era saber por qual motivo o coelho conseguiu escapar, mas por que diacho o disco estava girando, girando, girando, girando, girando…

 

Verde que te quero verde

Domingo de Páscoa foi inesquecível. Depois de ganhar ovinho da mamãe, do papai, da vovó e do vovô, Totônio queria mais. Não chocolate. Mas hambúrguer de siri. Tudo culpa do Bob Esponja.

Pego o guri na casa do pai e vamos rumo à Meca da junk food: o drive-thru do McDonald’s. Lotado, mas suportável. Compro um lanche da felicidade, sem queijo, sem picles, sem praticamente nada.

_Que bebida, Totônio?

_ Água. Geladinha.

Totônio é assim. Pequeno, mas muito, muuuuuito exigente. 

Ele exige da gente. Muito. Demais. Pra caramba. A ponto de me deixar quase careca. Por isso já deixei meu cabelo curtinho. Fica mais fácil quando a queda acontecer.

_ Não esquece do alface, tá mamãe.

Claaaaaro. O único verde do lanche da felicidade é aquele do picles. Mas, como eu sou precavida e adivinho as coisas, tinha alface verdinha lavada na geladeira. 

_Qual o brinquedo?, pergunta a moça.

_ Putz. Qualquer um. O que faz aquele ali?

_ Nada. Nenhum faz nada.

_ Então, me vê aquele passarinho verde bicando alguma coisa (o passarinho era um corvo, na real).

Retiramos o pedido e fomos pra casa.

Na garagem, descubro que não me deram o brinquedo. Totônio começa a berrar na cadeirinha.

_Ok. Você venceu!

Como era perto, decidi voltar. Estacionei na rua. Peguei o guri no colo e entrei pela saída.

_Moço, vocês esqueceram de me dar o brinquedo. E o Danoninho também. 

Totônio não quer saber mais de Danoninho, só de chocolatinho. Mas eu paguei pelo combo inteiro, então eu mesma como essa coisa.

De volta à garagem. Taco um ovo dentro da mochila e coloco nas minhas costas. Com a mão esquerda, carrego outra sacola com mais ovo e a sacolinha do lanche da felicidade. No meu lado direito, o piá se encaixa no colo para alegria da minha escoliose e satisfação das minhas varizes. E vamos nós, rumo às escadas que levam ao quarto andar. Próximo passo é fazer mágica: transformar o sanduíche em “siriburguer”, que de siri não tem nada. Tá mais pra “vegburguer”. 

Tiro a carne (sim, veio com carne) e deixo as duas fatias de pão abertas para recheá-las com o mais puro e delicioso sabor de alface.

Sem que eu me desse conta, Totônio já havia devorados as folhas. Então eu pego a travessa de novo e faço uma montanha verde. Verde que te quero verde, ao melhor estilo Garcia Lorca e seu “Romance Sonâmbulo”:

Verde que te quero verde.
Verde vento. Verdes ramas.
O barco vai sobre o mar
e o cavalo na montanha.
Com a sombra pela cintura
ela sonha na varanda,
verde carne, tranças verdes,
com olhos de fria prata.
Verde que te quero verde.
Por sob a lua gitana,
as coisas estão mirando-a
e ela não pode mirá-las…

Fazia tempo que não me sentia tão feliz. Quando terminou, Totônio, meu verdinho, ainda queria meu pão. Mas eu não podia dar meu pão, porque ele estava pintado de amarelo e vermelho. Totônio só queria o verde da verdura, como o poema de Leminski que Caetano, o rei da paçoquinha de quarentena, musicou:

De repente
me lembro do verde
da cor verde
a mais verde que existe
a cor mais alegre
a cor mais triste
o verde que vestes
o verde que vestiste
o dia em que te vi
o dia em que me viste

De repente
vendi meus filhos
a uma família americana
eles têm carro
eles têm grana
eles têm casa
a grama é bacana
só assim eles podem voltar
e pegar um sol em Copacabana

Ou a verdura menos amarga da canção do Black Maria:

Verdura, Verdura
Pra saciar a fome de cultura
Verdura, Verdura
Plantando essa idéia e colhendo verdura madura
Que loucura
Me beija, me aleja, me pega e me cura

Gosto de Lorca, Leminski, Caetano, Black Maria, mas preciso deixar claro que não torço pra coxas nem verdes palmeiras. Essa cor, aliás, não é minha preferida, mas não posso negar que traz renovação e um pouquinho de esperança que Tistu, ops, Totônio volte a comer verde novamente.

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A Quaresma vai e a Quarentena fica

Toda vez que olho para o meu filho, costumo lembrar do dia em que Totônio nasceu. Ao ver aquele serzinho tão frágil, pensei: esse menino vai salvar o mundo. Meu companheiro de quarentena está salvando o meu mundo. Totônio foi concebido em 2 de fevereiro, dia de Iemanjá, também conhecida como Janaina. Como eu sei? A certeza era tanta que os primeiros enjoos só confirmavam o que eu já sabia. Também tinha absoluta certeza que daria à luz um menino e que esse menino teria nome de santo. 

Desde as primeiras alterações no meu corpo, chamava Totônio carinhosamente de “Gordinho”.  Eu passava tão mal que o exame de sangue acusou um nível de hormônio altíssimo. Na consulta ao ginecologista, já era possível ouvir o coraçãozinho de Totônio bater. Chorei. Eu sempre choro.

Essa quarentena é, na verdade, a segunda que Totônio e eu atravessamos juntos. A primeira foi durante o pós-parto. Se você pesquisar no dicionário vai encontrar que quarentena, entre os inúmeros sentidos, significa a fase de abstinência sexual, chamada também de resguardo. É o período pelo qual as puérperas devem passar até que corpo e mente se restabeleçam. Existem mulheres que simplesmente ignoram essa fase, talvez por pressão do parceiro, e nove meses depois estão lá, de volta à maternidade. 

Não seria nada mal se Totônio tivesse um irmãozinho. Quem sabe ele não me chamaria de cinco em cinco minutos para brincar ou simplesmente ver televisão com ele ou acompanhá-lo ao banheiro pra fazer xixi. Quem sabe eu poderia tomar café da manhã tranquilamente enquanto os dois brincassem sozinhos. Quem sabe.

Provavelmente, Totônio não terá um companheiro por parte de mãe. Esse é o problema de engravidar tarde, se separar, decidir estudar, ter que procurar emprego e emendar em outra quarentena, essa provocada pela pandemia de covid-19. Recorrendo ao Tesauro Eletrônico do Ministério da Saúde, a palavra passa a significar o “isolamento de indivíduos ou animais sadios pelo período máximo de incubação de doença”. E esse período de isolamento é bem provável que ocasione um baby boom, assim como aconteceu no pós-guerra.

Depois que Totônio nasceu, guardei várias roupinhas dele pensando na possibilidade de um dia engravidar novamente. Mas esse desejo foi se desmantelando, e aos poucos fui doando o enxoval e toda a mobília do quarto. Deve haver no mínimo umas 10 crianças que puderam aproveitar as coisinhas do guri. Confesso que ainda escondo umas pecinhas de roupa no armário dele, como a saída de maternidade que a vovó Silvia comprou. Vermelha para afastar mau olhado.

Vermelho também simboliza a cor do amor, da paixão, do coração, do sangue. Sangue que Cristo derramou para nos livrar do pecado. 

A Quaresma já terminou, mas a quarentena continua. 

No último dia que Totônio foi à escola, desejei feliz Páscoa para as profes porque a previsão era de que as aulas fossem retomadas na segunda-feira, 13 de abril. A diretora me olhou e ficou surpresa ao ligar os pontos. “Simbólico, não é mesmo?”, comentei.

Ou seja, a promessa era de vida nova nesta semana. #sqn

Na verdade, a vida nova começou com a quarentena. Pra mim, um pouco antes. Desde o ano passado, venho me adaptando a um mundo diferente, quando decidi viver um dia de cada vez. Dar valor ao presente, ao aqui e agora, entender o mindfulness, que virou modinha, mas é uma prática milenar que visa melhorar nossa qualidade de vida. Não é preciso ser coach para sacar que ficar preso ao passado e fazer planos para o futuro pode nos levar à ansiedade, depressão, frustração. Evidentemente, na prática, não é tão simples assim. O apego que temos ao passado e ao futuro é enorme.

Hoje, lê-se muito sobre isso. Todo site, todo blog, todo cronista, colunista, influencer, intelectual comenta sobre essa mudança de rotina que fomos obrigados a adotar por conta da pandemia, como fazer home office e aproveitar o tal ócio criativo, conceito desenvolvido pelo sociólogo italiano Domenico De Masi (cuja palestra tive a oportunidade de assistir ano passado). Problema é que essa criatividade precisa acontecer dentro de casa. 

Fato é que precisei abdicar da minha vida de luxo – que seria abrir mão do meu pilates, da minha diarista, por exemplo – para economizar. Se há uma meta que pretendo alcançar é viver com o necessário, lema que meu irmão abraçou há anos e que agora passa a fazer muito sentido. O tio Zé trabalha em mercado e está na linha de frente dessa guerra em que o Brasil já ocupa o 11º lugar no ranking de mortos, informação ignorada por essa gente que desrespeita o isolamento social.

Acredito que essa crise nos permite mensurar nossas prioridades. Só que, num mundo consumista, egoísta, de narcisos, exigir que todos alcancem esse grau de compreensão ainda é utópico. Certamente tudo isso servirá de lição de casa pra Totônio, que volta e meia vai para sua lousa; pega a caneta e finge que é professor. 

Daqui a pouco, ele acorda para procurar seus ovinhos. Para nós, essa Páscoa sempre será lembrada como a passagem definitiva para uma vida nova. Pois a esperança é a última que sucumbe ao vírus.  

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Foto por Breakingpic em Pexels.com

A máscara caiu

O protocolo é usar máscara. O baile continua para aqueles que dançam conforme a música e cobrem suas bocas sem dar um pio. Que escondem seus sorrisos por trás de um tecido fino preso por elásticos. Mas o sorriso ainda está lá. Com ou sem dentes.

Para outros, a máscara caiu. Os rostos foram desnudados pela quarentena. O isolamento nos proporciona descobrir “quem é quem” nesse jogo de esconde-esconde. É como se fosse possível fazer um raio X de quem você conhece, ou acredita que conhecia. Alguns casos mais delicados precisam de tomografia, exame que revela com maior precisão o grau do problema, o grau da lesão. O contraste ajuda a definir o nível de vaidade. De egoísmo. O grau de maluquice. De gula. De carência. De insegurança. De avareza. De Inveja. Cobiça. Ira. Luxúria. Soberba. Preguiça. O grau da mentira. Mas também faz reluzir o estágio do altruísmo, de tolerância, de honestidade. Potencializa a força da amizade, do amor, do carinho, do companheirismo.

No raio X dos vaidosos, detectamos um nódulo que mostra um mundo perfeito. Esse pessoal tem dificuldade de olhar para os lados e trava um discurso um tanto ambíguo. Descobriram esse tal mundinho perfeito durante o confinamento. Trabalhando em casa, cozinhando, fazendo coisas que todos – vamos combinar – estamos fazendo, mas que a grande maioria não precisa ostentar. Sair se gabando por aí de atitudes corriqueiras que devemos, sim, dar valor no dia a dia, mas que não há necessidade de transformá-las numa fantasia. É bom ter pés no chão. É saudável ficar sem maquiagem. Sem salto alto. 

Nos confins do confinamento, o vaidoso está lá, com suas caras e bocas, pedindo, suplicando por uma aprovação qualquer nesse grande Big Brother. Um like. Um coração. Um aplauso que seja. O laudo diz que a vaidade pode ser provocada pela combinação de carência com insegurança. E como não há sustentação sem ancoragem, o tombo, a queda, o mergulho para esses que vivem nessa bolha machucam em dobro. O ego vai subindo, subindo, subindo até que… plaft. Leva o vaidoso direto pra UTI.

No raio X dos altruístas, detectamos uma íngua, benigna, que se manifesta quando alguém está em apuros, quando alguém precisa de um prato de comida na rua, um cobertor, uma roupinha para o neném que nasceu ou uma simples palavra de carinho, mesmo à distância. É como receber o chamado de Batman no céu. O herói morcego, animal que pode ter transmitido o coronavírus aos humanos. Para o xamanismo, o voo do morcego significa a iminente transformação do ego. Quando um ciclo se encerra e dá a vez a outro. Eu li na internet que o totem do morcego simboliza a ilusão, o renascimento, os sonhos, as intuições. Que permite viagens espirituais e melhora a comunicação. Na China, o único mamífero voador é sinônimo de felicidade e sorte. Quem diria.

Totônio nunca gostou de usar máscaras, mesmo sendo fã dos PJ Masks. O Lagartixo tinha sua máscara verde, mas algo o incomodava. Talvez se sentisse sufocado ou talvez o elástico apertasse suas orelhas. Sua primeira fantasia foi de Batman, o homem morcego. Não tinha máscara, só um cinto. 

O guri, por enquanto, decidiu que não quer máscara. Não precisa esconder sua identidade. Sua principal arma atualmente é o álcool gel nas mãos que precisa passar a cada saída da nave-mãe.

Resta saber qual será o resultado desse retiro espiritual que estamos fazendo. Se a vaidade dará lugar à modéstia. Se o morcego ainda terá asas pra voar.

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Foto por Edward Jenner em Pexels.com

Ganhei o dia duas vezes

Hoje o cansaço bateu, mas eu ganhei o dia. Duas vezes. 

Aos 4 anos, Totônio não é o exemplo de piá bom de garfo. Bem diferente de quando começou a se aventurar pelo mundo dos sólidos. O menino comia de tudo. Era um pequeno glutão. Minha vida era amamentar e cozinhar. Dormir, pra quê? 

Eu fazia panelas de comida, sempre seguindo o mesmo ritual. Cortava os legumes bem cortadinhos. Suava por causa da beterraba. A abóbora já comprava em pedaços. Fazia tudo a vapor. E na parte debaixo, na água fervente, ficava o arroz e a carne do dia. Tudo cozinhava harmonicamente. Depois era só amassar, socar tudo, apertar tudo para transformar na papinha do Totônio. Nada de liquidificador. 

Teve uma época em que comecei a comprar fígado. Não entendo como alguém pode gostar de fígado de boi, mas é muito rico em ferro, como todos devem saber. E, segundo a pediatra dele, as crianças precisam e devem ingerir proteína animal. Certa vez ela me disse que virar vegetariano é uma opção para o futuro. Então tá!

Totônio também era uma máquina devoradora de morangos. Hoje ele gosta de pêssegos. Mas, aqui em casa, não come frutas e verduras como outrora. 

Na escola, o papo é diferente. Ele come melhor. 

Em tempos de quarentena, Totônio só pensa em comer carne de porco. Bacon, linguiça, doguinho. Mas hoje. Ah, hoje! Ele comeu peixe. Devorou um filezão de peixe. Deixou o macarrão e a batata frita de lado e partiu pro ômega 3. Por isso, digo que ganhei o dia!

Pra fazer Totônio comer, às vezes é preciso inventar moda. Apelar pra criatividade. Quando faço ovos mexidos, pego as forminhas de massinha dele para moldar os pedacinhos. Sai formato de nuvem, de círculo, de estrela. O duro é que não encontrei mais essas forminhas e ontem fiz um coração à mão livre. Mas Totônio não quis comer o meu coração. Na verdade ele nem partiu o coração. Então, só meu restou almoçá-lo hoje junto com o arroz e feijão que ele também dispensou na janta da noite anterior. 

Agora eu entendo perfeitamente o que meu pai fazia quando eu era pequena. Comia tudo o que estava vencido na geladeira, as sobras. Hoje eu faço isso com Totônio. Venceu o petit suisse? Então, bora comer. Mesmo sem vontade. Isso é ser mãe. Isso é não desperdiçar.

O segundo gesto que me fez ganhar o dia vale por mil. De repente, Totônio me puxa pela mão e diz:

_Mamãe, hoje eu vou dormir com você! 

Fez um high five e me levou pro quarto.

Totônio quase nunca dormiu na minha cama. Nos dois primeiros meses de vida,  era no meu colo e no colo da vovó que ele adormecia. E eu? Dormir pra quê?

Depois foi pro berço e pra caminha. Só que ele tem o hábito nada agradável de pegar no sono no sofá da sala. Eu costumo deitar pra um lado e ele pro outro. Quando ele chega no estágio do sono, digamos, mais profundo, eu o carrego para o quarto. Toda santa noite é assim. Minhas costas ainda sobrevivem.

Só que tem dias que eu capoto de sono, de tão cansada, e só acordo duas horas depois pra levá-lo pro quarto. Por isso hoje me surpreendi com o comportamento dele! Talvez tenha percebido meu cansaço misturado com um pouco de carência, e resolveu dormir na cama da mamãe. Agora meu peixinho está aqui do me lado, com seu edredom branco que ele não desgruda e o travesseiro que eu usava quando criança. Bons sonhos, Totônio! Sonhe com um belo passeio no parque! Sonhe em abraçar a vovó e o vovô! Sonhe com o futuro!

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O chulé no corredor e a escapadela da nave-mãe

Saí da nave-mãe para levar Totônio até o foguete do papai. Para cumprir nossa missão e chegar até o carro, foi preciso transitar pelos corredores sem janelas do nosso prédio, invadido pelo cheiro de chulé. Agora sei quantas pessoas, seus respectivos sexos e prováveis faixas etárias, ocupam cada apartamento, já que se tornou um hábito entre os condôminos deixar o calçado pra fora antes de entrar no apê. Eu acho engraçado porque sempre cultivei esse costume, que herdei da minha mãe, de entrar em casa e tirar imediatamente os sapatos. Por isso aprecio a cultura japonesa desde pequena, mesmo tendo ascendência espanhola e portuguesa. 

Acredito que, acima de tudo, é uma questão de puro bom senso não andar no quarto com o mesmo calçado que você pisa no cocô de pombo na rua.

É bonitinho ver ali os chinelinhos das criancinhas todos enfileiradinhos; o Nike do rapazote, o Crocs da velha, as Havaianas da vizinha nova. Não tenho chulé, mas os meus tênis não ficam expostos desse jeito, pra todo mundo ver. Ficam pra dentro. Não vejo problema na minha decisão em deixá-los em cima de um pano perto da porta. Totônio também não tem chulé e já aprendeu que precisa tirar seus microtênis assim que coloca os pés na sala.

Dessa forma, ele pode correr com suas meias antiderrapantes sem fazer barulho e não incomodar os vizinhos do andar de baixo. Bem, na verdaaaade nossa correria diária deve estar incomodando um pouquinho os vizinhos. Mas a bateção de portas também me incomoda um bocado. Tenho uns vizinhos que ou são meio irados, ou têm muita força no muque a ponto de estremecer o prédio. Acho que descontam tudo nas portas. Só pode. 

Nosso dia 8 transcorreu “ok”. Totônio acordou de bom humor e correu ao encontro de seu livro de atividades com 505 passatempos entre labirintos, jogo dos sete erros, liga pontos e continhas de matemática. Obviamente eu ajudo nas operações aritméticas, mas Totônio já sabe que 2 + 2 = 4. Como a mamãe é fã de Radiohead, ele aprenderá mais tarde que 2+2=5. O guri presta atenção e, depois de supostamente aprender no livro, vai direto pra lousa onde brinca de professor. Seu 6 parece uma pera. O 2 é tipo um 5 do avesso.

Totônio também convocou Bob Esponja e Patrick para brincarem conosco no jogo do pizzaiolo. Eu nunca imaginei me tornar tão íntima de uma esponja-do-mar, muito menos de uma lula. Então, Totônio distribuiu pedaços de pizza de papelão pra mim e seus dois amigos imaginários famosos. Depois, pegou o vulcão que acoplamos nos trilhos de um brinquedo dele que tem uma alavanca para simular as lavas. 

_Totônio, o que é isso?

_ É o botão pro Bob Esponja e o Patrick voltarem pro fundo do mar!

_ Ah, claro! 

Quem sabe um dia a gente volte a ver o mar. Pode até ser um mar de gente que não tem problema. Hoje, no nosso nono dia de quarentena, Totônio acordou às 6h pra fazer xixi. Não nas estrelas como na letra da Leminskanção, mas no banheiro mesmo. Depois foi dormir no sofá. Aproveitei e fui ver o sol nascer. Redondo, ainda. 

Hoje, sabadão de quarentena, até tinha um bocado de gente na rua. Todo mundo se desviando com medo de trocar fluidos. Nem acreditei que fui à padaria e caminhei um pouco pela calçada com minha mãe, que precisa se exercitar por conta da asma. Ficamos a 1,5m de distância como exige o protocolo.

Na verdade, me senti até um pouco culpada por ter saído de casa. Pensei até que meus vizinhos me jogariam os calçados chulezentos na cabeça quando retornasse. Mas cá estamos de volta à nave-mãe. De castigo, mas seguros!

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Depois da quarentena vem…

Depois da tempestade vem a bonança. Depois da quarentena vêm…os boletos e o desemprego. Sei que devemos manter a positividade numa hora complicada como esta, mas a realidade é preocupante. Se já estava difícil se recolocar no mercado com o cenário menos apocalíptico, imagine depois desta pausa que o vírus nos obrigou a fazer. O dilema está mais vivo do que nunca: o que vem antes? Saúde ou dinheiro? Sem saúde não conseguimos trabalho. Sem trabalho não temos dinheiro. Sem dinheiro não temos plano de saúde. É um beco sem saída. 

Enquanto não podemos sair pela porta da frente, continuamos aqui observando tudo pelas janelas da nave-mãe. Esperando que chova pelo menos alguns centímetros pra baixar essa poeira toda. Na verdade, eu ficaria realmente preocupada se a lua resolvesse nascer do lado oposto. Ou se eu acordasse no meio de um filme do Lars von Trier. 

No prédio, já dá pra sentir a angústia das crianças que não suportam mais ficar em casa. A menininha de três anos corre para a porta e fica gritando desesperada por uns dez minutos.

_Mamãe, eu quero sair!!

_Mamãe, quero ir à casa da vovó!!

Pela janela, também escuto o estopim do cansaço de uma vizinha descontrolada, mãe de dois piás. O mais novo quase da idade do Totônio. O guri não para de gritar. Dá um nervoso. Então, a mãe berra:

_ PARA DE GRITAR!

O menininho parece obedecer ou…melhor nem saber o que aconteceu. Tudo isso é um teste. Teste de paciência, resiliência, resistência. Aquelas “ências” todas. 

Totônio continua tranquilo. Nosso sétimo dia foi dedicado à pintura. O guri pintou, mas não bordou. Fez um vulcão enorme numa cartolina que encontrei perdida e eu fiquei encarregada de desenhar o sol. O problema é que o rapazinho gasta toda a tinta de uma vez só. E a minha aflição é tão grande que dá vontade de fechar os olhos e só depois ver o estrago que aquela mãozinha de arco-íris faria pela casa. Nosso Picasso aqui só sujou o chão. Ufa! Durante essa quarentena, acredito que, 50% do tempo, passo com um pano não mão. Bandeira branca!

Totônio continuou pintando o sete e o meu rosto. Numa época como essa, a gente precisa dar a cara a tapa. Ele foi até o banheiro procurar um lápis delineador. Encontrei uma sombra em bastão que praticamente nunca usei e dei pra Totônio, que desenhou um círculo contornando meu rosto e vários pontos pretos. 

_O que é isso, Totônio?

_ É um cookie!, disse ele.

Ou seja, eu virei a mamãe cookie. De chocolate preto.

O desenho, porém, não foi recíproco. O guri não me deixou fazer uma pintura magnífica no rostinho dele. Só depois que pegamos uma tinta da época da Copa do Mundo, que provavelmente está vencida, ele me coloriu até o pescoço e se pintou sozinho. Colorido também ficou nosso brigadeiro, mas adivinha se Marco quis comer? O negócio dele é paçoquita mesmo.

À noite, Totônio encontrou a lanterna da Peppa Pig e fez surgir várias estrelas no céu da nossa nave-mãe. Como é tradição, pediu para ver mais um desenho na TV e dormiu depois de tomar um mamá com a fórmula do amor e o gosto da lua. 

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Brincadeiras improvisadas que rompem o silêncio

Abraço, tempo, emprego, liberdade, família. O confinamento nos permite valorizar  gestos, pessoas, coisas banais, corriqueiras, comuns. A dar valor àquilo que somos impedidos de ter e fazer. É como a máxima: “só damos valor quando perdemos”.

Neste sexto dia, recebi via WhatsApp um texto do Augusto Cury sobre exatamente o quanto a vida frenética nos impossibilita ou dificulta apreciar pequenas ações do cotidiano, seja um simples aperto de mão ou a possibilidade de ir à padaria. Mas ele não citou algo fundamental e que agora somos capazes de fruir: o silêncio. 

Do nosso apê, transformado em nave-mãe, o silêncio é mais intenso do que no domingo, quando Deus descansou. É uma calmaria que não remete propriamente à paz, mas à angústia, à solidão. Mesmo assim, é possível transformar essa quietude um tanto nervosa em serenidade, em introspecção, no silêncio interior. É hora de refletirmos, de priorizarmos o certo, de pensarmos no que é necessário. Uma infiltração no banheiro do vizinho pode esperar mais um mês para ser sanada. Quem não pode esperar é aquele que precisa sobreviver. Leio comentários pelas mídias sociais sobre o consentimento que vem do silêncio. Eu acredito que o silêncio pode ser uma bela resposta também. 

A mudez lá de fora é quebrada por alguns veículos que cruzam as ruas ou pelo latido dos cachorros, aos quais é permitido ir e vir. Aqui dentro da nave-mãe, a correria de Totônio é vibrante, mas não deve incomodar os vizinhos que, provavelmente, fazem home office. Afinal, não temos escapatória. 

À tarde, Totônio se revoltou, porque queria sair, ir ao parque com piscina de bolinha. Ele sabe que ainda não pode deixar o apartamento. Então, a lista de lugares para explorarmos na pós-quarentena aumenta: torre panorâmica e parque com a piscina de bolinha.

Pra mim, o piazote está se virando bem nesses dias de clausura. E eu, a cada dia que passa, amo mais meu filho e aprendo mais com meu companheiro de quarentena. Sua capacidade de improvisar vem superando minhas expectativas. Eu simplesmente não preciso inventar brincadeiras, porque ele mesmo tem as ideias e me intima a participar de todas elas. 

O cinto do meu roupão vira cabo de guerra. Na falta de um irmão ou amigo, o aspirador de pó vira companheiro de pega-pega. A mamãe aqui corre como uma doida atrás do guri. 

_ Vem amiguinho, vem me pegar!, diz Totônio.

Não sei se dou risada ou choro. Chorar não. Já chorei o que tinha que chorar muito tempo antes desta quarentena começar. Agora são risos, só risos (mesmo um pouco amedrontados).

Na falta de uma bola perdida (que já foi encontrada, por sinal), Totônio amassou um folha A4 – onde ele desenhou o mapa do tesouro no quinto dia. E essa bolinha de papel virou um dado que vai do zero ao sete. Um por um, ele montou os EVAs no corredor. O tapete se transformou num híbrido de amarelinha improvisada com jogo de tabuleiro. Totônio arremessava o dado de papel e imaginava os números e cada cor do EVA representava um desafio.

Quando a slime nova chegou (a que ele tinha estava grudenta e, infelizmente, não disponho dos ingredientes pra fazer uma meleca caseira), graças a uma compra online sugerida pela vovó, Totônio não se continha de felicidade. E os EVAs se transformaram em pista de corrida, com a geleca de obstáculo.

Boa parte das brincadeiras dele se baseiam na sua fixação por assistir Super Mario no YouTube e outros joguinhos. Ele reproduz o que vê do seu jeitinho fofinho de ser. Até comemora igual. O pódio sempre tem dois lugares. O puff mais alto pra ele e a almofada pra mim. Ele sempre é o segundo 1 e eu, o segundo 2. Totônio comemora com sua dancinha da vitória e sua risada maravilhosa, melhor do que qualquer silêncio da face da Terra. 

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Não há lugar como nosso lar!

O carro do sonho em meio ao pesadelo

_E o carro do sonho?, pensei. Será que ele ainda vai passar? Mas não deu cinco minutos e, como num passe de mágica, surgiu aquela voz familiar dobrando a esquina. O carro do sonho, freguesia, não se rendeu à quarentena. Pois quem vive de sonho precisa sobreviver também. 

Toda vez que escuta o alto-falante, Totônio corre para as janelas acompanhar o motorista. Primeiro no quarto da mamãe, depois no quarto dele. Fica lá em cima da cama, esperando o carro passar. Como nosso prédio é recuado, nunca tivemos tempo hábil de descer as escadas e apanhar o sonho a tempo. Na verdade, nunca tentamos. E não é na quarentena que vamos arriscar. Que pena 😦 

Mas Totônio não gosta de comer sonho. Ele gosta de me contar seus sonhos. Hoje ele sonhou que estava passeando pela Torre Panorâmica, porque está aprendendo na escola sobre os pontos turísticos de Curitiba. Acordou e veio correndo me contar entusiasmado juntamente com a notícia de que estava sequinho de xixi (o que não era bem verdade). E eu prometi a ele que o primeiro lugar aonde iremos quando isso tudo acabar será a torre. 

Por enquanto permanecemos no bunker, na bolha da nossa nave-mãe. A quinta manhã de confinamento entre as paredes do nosso apartamento é mais um capítulo dessa experiência de muitas “ências”: paciência, resiliência, sapiência…

Como toda criança, Totônio é um poço de criatividade. Eu não preciso nem bolar atividade ou ir atrás de uma brincadeira mirabolante que ele já inventa um par delas. Nada como um paracetamol para aliviar minha dor de cabeça matutina e seguirmos na jornada de aventuras espetaculosas.

Primeiro, Totônio baixou mais um aplicativo com um joguinho chamado Talking Tom. Na hora de batizar o gatinho, ele escolheu o nome “Amor”. Depois, brincamos de caça ao tesouro. O piazinho desenhou o mapa para encontrarmos as moedas de chocolate espalhadas pela casa toda. Ele mesmo desenha a rota, esconde as moedas, encontra e depois…não come e as coloca sobre os Xs no mapa.

Também teve a corrida de obstáculos. Totônio começou a catar os brinquedos ao redor, EVA, puff, almofada, e ordenou tudo pela sala. Daí, começou a saltar. Outra versão do jogo, foi fazer zigue-zague pelos objetos. E assim continuamos nossos dias enfurnados na nave. Enquanto isso, a Índia se prepara para a maior quarentena da história, 1,3 bilhão de pessoas. Enquanto isso, o vírus chegou a Nova York como um trem-bala. Enquanto isso, a Olimpíada foi adiada pela primeira vez na história depois da guerra. Enquanto isso, tentarei contar uma história diferente pro Totônio dormir. Que desperte mais sonhos durante esse pesadelo.

A quarentena de Totônio

Dia 4. Difícil explicar para uma criança de 4 anos por que devemos ficar tanto tempo sem sair de casa. Por que, de repente, parece férias de novo. Mas um recesso sem brincadeiras com os amigos, sem visita aos avós, sem ir ao parquinho da praça ou do clube. 

O que nos resta é o nosso lar. Nosso amado lar. É como se nosso apartamento se transformasse numa nave terrestre. Nossa Apollo 2020. Da porta pra fora, só com traje de astronauta. Sem tocar em ninguém, sem pegar no corrimão, sem abrir a boca pra não contaminar. Sem aperto de mão, sem poder abraçar a vovó ou o vovô. 

As aulas do Totônio só seriam suspensas hoje. Na quinta passada, ele foi normalmente para a escola, onde se sente feliz, amado e cuidado pelas profes, alimenta-se bem, brinca com os amigos que adora. O duro é que apenas algumas crianças – acho que quatro – de todas as turmas faziam companhia a Totônio. Ao perceber a ausência dos amigos da sala, Totônio se sentiu desconfortável. Então, desde sexta, ele está em casa, porque seria provavelmente o único aluno a ir à escola. Esse foi nosso “dia 1”.

Difícil fazer uma criança tão exigente quanto meu filho comer bem em casa. Quase impossível manter os “combinados” do tipo: só deixo fazer isso, se fizer aquilo antes. Eu tento reproduzir as receitas da escola, mas a comidinha da tia da cozinha e a companhia dos amigos são sempre melhor que o tempero da mamãe. O quibe da escola é sempre melhor que o meu. Sem contar que o piazinho é sempre do contra: faço feijão carioquinha, ele quer preto. Faço suco de laranja, ele diz que não gosta da cor. Faço ovo cozido, ele só quer a clara. O pai comprou sorvete de chocolate, e Totônio implica de novo com a cor e o gosto. Aff. Eu vivo dizendo pra ele: tem criança que não tem opção. Mas acho que o guri é muito pequeno para entender o sentido de passar necessidade. 

Já no segundo dia de confinamento, eu larguei mão. Totônio ficou com o pai e eu fui me aventurar no mercado. Vesti meu traje de astronauta e, desafiando a lei da gravidade da doença, fui às compras, devidamente higienizada, unindo forças para não conversar com ninguém. É claro que não consegui! Mantendo uma distância segura, troquei uma ideia na fila com um rapaz que precisava comprar cigarro para o pai. “Veja que situação. Não sei nem como comprar cigarro. Nunca fiz isso!”. E ele me olhou com um rosto de desamparo. Eu desejei meu “tudibom” e fui embora cheia de porcaria nas sacolas.

Na semana passada, já estava garantido no congelador o saco com dois quilos de batata pré-frita. Santa air fryer. Dessa vez, comprei bacon, iô-iô crem com tubetes, chocolate, leite condensado, farinha pra bolo. Sem medo de ser feliz. Sem medo do fim do mundo.

O mesmo esquema em relação às telas da televisão, do celular. Enquanto faço faxina, Totônio fica jogando. E as sessões de Bob Esponja são intercaladas com brincadeiras. Domingo na nave-mãe teve dança das cadeiras ao som do novo álbum de Morrissey. Até que, durante uma das músicas, Totônio observou: mamãe, parece a música do anjo (que é Precious, do Depeche Mode). Esse é o nosso repertório de confinamento. 

Meu sofá talvez não sobreviva até abril. Virou pula-pula. Neste quarto dia, armamos barraca em nossa espaçonave que nos dá direito a uma vista espetacular para o céu. O outono ainda nos permite tomar banho de mangueira e pude simular uma cachoeira: eu aponto o esguicho para o vidro da porta que ricocheteia em Totônio. Meu guri conduz alegremente seu triciclo sob os pingos, cantando e me contaminando com seu sorriso consolador. 

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