Caetano Veloso – ao vivo

Mondo Bacana

Ao lado dos três filhos, cantor comemora 78 anos fazendo da tão esperada live um doce acontecimento musical em meio à pandemia

caetanolove2020mbTexto por Janaina Monteiro

Foto: Globoplay/Reprodução

live de Caetano Veloso não foi qualquer coisa: foi um acontecimento. Depois de meses tentando convencer o baiano a se apresentar em tempo real, Paula Lavigne, empresária e companheira do artista, fez valer seu poder de persuasão – que já dura anos – e conseguiu que Caetano fizesse um show quase todo acústico ao lado dos filhos para comemorar seus 78 anos de vida, no último dia 7 de agosto e às vésperas do dia dos pais.

Às 21h30, a família Teles Veloso abriu a porta de casa para os convidados conectados no serviço de streaming Globoplay (com sinal inclusive para não-assinantes, vale ressaltar), indo na contramão de outros artistas, como Milton Nascimento e Gilberto Gil, que fizeram lives pelo YouTube…

Ver o post original 916 mais palavras

Alan Parker

Mondo Bacana

Oito filmes para lembrar para sempre a trajetória do diretor e roteirista britânico que morreu aos 76 anos de idade

alanparkerMBTexto por Janaina Monteiro

Fotos: Reprodução

Difícil saber qual filme de Alan Parker fez mais sucesso. O diretor e roteirista, que morreu aos 76 anos decorrente de uma “longa doença” (não informada pela família) no último dia de julho deste ano pandêmico, foi mestre em fazer um cinema comercial de qualidade e capaz de arrebatar grandes bilheterias. Saudosa época em que se formavam filas para assistir aos filmes do londrino que migrou da publicidade para o cinema na década de 1970.

Versátil, Parker transitava entre gêneros e conseguia tecer críticas ao sistema, denunciando a violência sem soar agressivo. Alcançou o estrelato com O Expresso da Meia-Noite (1978). O drama, com roteiro assinado por Oliver Stone, foi inspirado em fatos reais. A história do jovem americano preso por tráfico de drogas na Turquia rendeu-lhe…

Ver o post original 1.082 mais palavras

O Zé de todo mundo*

Em 1999, o ex-maldito re-nascia para a juventude universitária ao pisar no palco do festival Abril Pro Rock, em Recife. Ano passado, no mesmo festival, saiu do show direto para o hospital com princípio de infarto.

Um fim de semana de abril de 2003. Abril Pro Rock em sua 11º edição e o baiano de Irará no palco da Sociedade Vasco da Gama, mais conhecido como o palco do Forró Calamengau, em Curitiba, apresentando seu mais novo manifesto: “Companheiro Bush”, título do CD a ser lançado pela Trama. A canção foi especialmente dedicada ao presidente dos Estados Unidos, em quem provavelmente deve faltar um parafuso, segundo Tom Zé, com seus quase 67 anos, dono de uma das poucas mentes lúcidas da música popular brasileira.

O show começa com vaias.

Vaias à introdução com o hino dos EUA. A platéia seleta formada por músicos, atores, artistas plásticos, jornalistas, professores e muitos, muitos universitáios era convocada a repetir, uma, duas, três, quatro… quantas vezes fosse preciso: “Se você já sabe/ quem vendeu/ aquela bomba pro Iraque/desembuche/ Eu desconfio que foi o Bush/Foi o Bush/Foi o Bush”.

O protesto contra o presidente rendeu versão em inglês de Christopher Dunn, professor da Universidade de New Orleans, e foi incluída na seleção musical da Protest-Records, gravadora virtual fundada por Thurston Moore, guitarrista da banda nova-iorquina Sonic Youth, em parceria com o designer Chris Habib.

É protesto sim. É protesto, é opinião, irônica, engajada. Tom Zé acumula funções: poeta, político, jornalista, sobretudo artista, com um diferencial primordial: a inexistência do ego inflado que a maioria dos artistas exalta.

Hipocrisia parece não ser verbete de seu dicionário prático de vivência. Simples no nome, prático no palco (“não, vamos começar essa música de novo”).

Rápido e imediato num discurso complexamente construído com cri-atividade no uso de suas figuras de linguagem e sonoridade musical inclassificável. Le Monde, Le Nouvel Observateur, L´Express, Le Vif, todos os Les saúdam as ideias de Tom Zé.

Um dia antes do show, o Zé dizia numa estação de rádio que ele como músico é muito sensível aos fatos do mundo, portanto não pode ficar calado. Dessa forma justifica que não é música de protesto o que faz, mas simplesmente o retrato do mundo que o circunda.

Mas Tom Zé… cantar “Meta sua grandeza/No Banco da esquina/Vá tomar no Verbo/Seu filho da letra”, em “Politicar” (o defeito número três do disco “Com Defeito de Fabricação”) é um baita de um protesto metafórico… nem tão metafórico assim, ele pede para a plateia exorcizar em uníssono vários “puta que pariu”, até que cada um atingisse o grau mais profundo de revolta interior.

Em frente ao cantor, muitos sabiam de cor suas canções, do disco “Jogos de armar – faça você mesmo”, lançado pela Trama em 2000, e do “Com defeito de fabricação”, de 1999. Outros estavam ali por curiosidade.

Havia os mais exaltados que urravam nos ouvidos do vizinho de plateia como se quisessem mostrar: “olha aqui, eu sei cantar”. Além daqueles que pensavam (pode ter certeza): bom seria se o Tom Zé fosse o meu avô e aprender com ele política crítica com uma didática muito mais atrativa e eficiente do que a aplicada nos ambientes acadêmicos. Isso com o auxílio de uma participativa banda de operários da música, vestindo cada um seu macacão: Cristina Carneiro, Sérgio Caetano, Marco Prado, Jarbas Mariz, Lauro Lélis e Gilberto Assis que embalaram logo de início “2001”, de Tom Zé e Rita Lee, gravada pelos Mutantes.

A passeata contra o imperialismo americano seguia: o músico pede para o Jimi Hendrix se render numa maracapoeira (“Bob Dica, diga/Jimi renda-se! /Cai cigano, cai, camóni bói/Jarrangil century fox/Galve me a cigarrete/Billy Halley Roleiflex”) e comenta: “vocês viram como eu consegui juntar vários cantores numa só música!”. Diz que logo o Brasil vai ficar rico quando o diabo do petróleo acabar: “O dólar é moeda falsa/O americano já não segura as calças/A Alemanha quase pedindo esmola/A inglesa não usa mais calçola”. E define a ONU como marca mortal numa parceria de deixar o pai do André Abujamra com orgulho.

Brincalhão, seu cinto vira gravata, e a gravata enrijece. Então ele simula como as brasileiras chegam ao tal do clímax e a banda toda em “Passagem de som”, um chamegá-exaltação, segundo ele: “Ai! Joãojacksonjoãogonzagá/ Gonzá Gonzá/ Ai ai Gonzá Gonzá/Ai Gonzá ai Gonzá … …  Gonzá Gonzá Gonzá/ Ó ó ó ó ó”.

Hahaha

No bis, aquela que faltava: “Made in Brazil”, de uma época tropicalista. Caetano Veloso diz que a Tropicália é de Tom Zé.

“São São Paulo” não estava no set list, mas a homenagem à cidade (que é também esculhambada na música) surge com o “Trem das Onze” e a lembrança de Adoniran e Demônios da Garoa. No fim, repetia entusiasmado: É Curitiba, É Curitiba. É…mas ninguém deu bola pra homenagem.

Diante daquilo que poderia se concretizar como uma verdadeira demonstração de nacionalismo (exacerbado?) e todo seu discurso sócio-político-filosófico, Tom Zé deixou escapar um detalhe: o que era aquela calça da Nike? Bonito, hein? E o boicote? Tudo bem…não vamos levar tão a sério assim. Tom Zé pode agora descansar em paz com sua juventude.

 

Captura de Tela 2020-08-04 às 00.50.48.png

*Texto publicado originalmente no Central da Música em 29/04/2003